terça-feira, 16 de abril de 2013

O SUS Além das Aparências

A primeira impressão é a que fica. Faça uma pausa, você que está lendo, e pense se concorda com este ditado tão popular. Tenho absoluta certeza de que todos nós já dissemos isso inúmeras vezes ao longo da vida, como também tenho a certeza de que nem sempre foi a primeira impressão a que ficou. Isso vale para aquele seu bom amigo que, antes de conhecê-lo, você não suportava, ou para aquela comida que antes você achava que tinha um aspecto indigesto, mas que depois de tê-la provado se tornou praticamente sua comida favorita, e não vamos nos esquecer daquele livro, hoje na sua estante, mas que você havia julgado pela capa. Alguns de vocês devem estar se perguntando aonde eu quero chegar com toda esta conversa. Ok. Logo entenderão.

Agora faço uma pergunta: o que você jovem entre 20 e 30 anos, nordestino, que utilizou o transporte público municipal esta semana, ou foi ao mercado fazer as compras do mês tem em comum com um indivíduo de 63 anos, sulista, que precisou, por exemplo, de alguma conduta como um transplante de órgãos? Nada em comum? Difícil de imaginar? Bem, o que tem em comum é que ambos precisaram e utilizaram o Sistema Único de Saúde (SUS), mesmo que a primeira pessoa o tenha utilizado de forma indireta. O SUS não se limita a procedimentos hospitalares, atendimentos médicos ou
consultas em postos de saúde. O nosso sistema público oferece uma verdadeira variedade de assistência em saúde, sem contar as vigilâncias sanitária e epidemiológica e as importantíssimas pesquisas no âmbito da tecnologia. E (sim!) até entendo quando você afirma que existem problemas em todas essas maravilhas supracitadas, e tenho certeza que a primeira coisa que passa na cabeça da gente são os problemas de “verba”, mas enquanto existirem problemas com gerentes e gestores do SUS, independentemente do financiamento, nós ainda teremos inúmeras dificuldades. 

Infelizmente, hoje em dia, a forma como todos vemos o SUS é justamente aquela que passa nos noticiários da manhã, tarde e noite, seja a nível regional ou até mesmo nacional. Como diria o estudioso da área Jairnilson Paim: o SUS onde faltam recursos e sobram filas. E é essa a visão que a maioria dos brasileiros tem. Volto a dizer: infelizmente! Vamos colocar um assunto em prática agora. Vez ou outra, vejo um usuário indireto do SUS, um que tem um “boooom” plano de saúde, dizendo que é uma falta de respeito uma pessoa esperar das 7 as 10 da manhã numa fila de algum serviço publico de saúde para ser atendido. Também acho que não deveríamos esperar tanto, mas o engraçado é que mesmo quando não estamos nos SUS, estamos num centro privado de determinada categoria de profissionais da saúde esperamos da mesma forma, ou até mesmo, muitas vezes, passamos das 7 as 10 da manhã esperando para conseguir marcar uma consulta que só vai sair dalí a três meses e, bem, estamos “pagando”. 

“Ora Maryelly, o SUS somos nós que pagamos. Não lembra nossos impostos?” Claro que lembro! E por isso mostro que, segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 80% dos usuários avaliados numa pesquisa a nível nacional, consideraram como bom ou muito bom o PSF (Programa de Saúde da Família) e de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e estatística), 80 a 90% das pessoas que buscaram o SUS nos últimos meses tiveram atendimento. Bem, os usuários diretos do nosso se sistema, parecem satisfeitos, mas isto o jornal não noticia. Agora façamos uma dinâmica: imagine o quanto você recebe de dinheiro em um mês. Ok, agora pense apenas na metade deste dinheiro (esta dinâmica não vale se você ganhar R$ 10.000 ou mais por mês e for solteiro!) e tente usá-lo para investir na sua alimentação, saúde, educação, lazer... Ficou difícil? Muito difícil? Pois é, dificilmente ou até mesmo nunca vocês ouviram falar que, por ano, o Brasil, o nosso Ilmo. Governo Federal gasta quase a metade do seu orçamento para pagar os altíssimos juros de uma dívida externa. Isso não dá ipobe. Isso ninguém comenta. 

Como também ninguém deixa claro o quão universal é o SUS. Alguns de nossos países vizinhos, nossos “hermanos” continentais não permitem que uma pessoa que possua plano de saúde seja atendida no serviço público. Nada mais justo. Mas o Brasil não. O Brasil permite que mesmo aqueles que pagam seus planos de saúde e que descontam no seu Imposto de Renda esses gastos com os planos privados, tenham acesso garantido. Até porque, mesmo pagando um bom plano, nos vacinamos nos postinhos de saúde do bairro. Na hora que se precisa de remédios caros, transplantes e UTI’s lá vamos nós de novo para o universal, bom e velho SUS. 

E a história de “Seu” João? Alguém viu ser noticiada? Este cidadão passou 31 anos internado num hospital psiquiátrico. Trinta e um anos. Depois deste tempo, chegou ao momento de receber alta. Graças ao programa “De Volta Pra Casa” do Ministério da Saúde, seu João recebeu apoio financeiro, capacitação para conseguir um emprego e conseguiu comprar um terreno, erguer sua casa e se reintegrar a sociedade. E existem vários outros programas como o Rede Cegonha, Humaniza Sus, Programa Saúde na Escola, Melhor em Casa, onde muitos destes, estão disponíveis para qualquer município brasileiro. E porque tão poucos aderem? Bem, isto envolve a capacitação e preparo do pessoal das secretarias. Até porque ainda hoje no Brasil, a qualificação de alguns funcionários (e não estou generalizando! Falo em alguns casos) não vem de uma análise curricular, mas sim de uma frase: você votou em mim? 

O problema todo é que não buscamos saber o que está por trás das mazelas do SUS, não temos a curiosidade em saber os motivos pelos quais acontece o que os noticiários mostram. Só falamos do que falta, do que não presta, da falta de atendimento e esquecemos de analisar questões importantíssimas como as que mostrei acima. O problema do financiamento posso dizer que é culpa nossa? Acho que sim, porque segundo Paim, o grande desafio do SUS, na atualidade, é político, “porque garantir financiamento para um sistema, que tem que passar por um conjunto de negociações e interesses no Congresso Nacional, no Executivo, no pacto da federação com Estados, municípios, União, implica em uma decisão essencialmente política”. Até onde sei, quem está no congresso nacional, por exemplo, está ali porque nós, brasileiros, assim determinamos e escolhemos. 

Então eu prefiro ver o copo meio cheio. Tento não julgar muito. E reconheço os inúmeros problemas que nosso SUS ainda apresenta. No entanto, não devemos nos esquecer de que não foi um político, um partido, um governo que criou o SUS. Fomos nós, a sociedade civil. Então, mais que criticar, porque não estudamos soluções? Porque não capacitamos os profissionais de saúde e seus gerentes? Porque nós, enquanto profissionais da saúde, não buscamos conhecer mais sobre a saúde pública e coletiva? Acho que da mesma forma que o criamos, conseguiremos transformá-lo. Juntos. Agora deve existir uma busca ativa pela mudança dentro de nós sejamos usuários, profissionais, gerentes ou gestores do SUS. Termino meu texto com duas frases, cujos autores desconheço. “Mais vale um passo dado de mãos dadas a mil, que mil passos dados por um homem só.”     

“Onde deu SUS, deu certo!.”


Referências

1 - BRASIL, Ministério da Saúde. 2013 Disponível em: www.saude.gov.br

2 - DELLOSI, M.E. A Casa de João. Revista latinoamericana de psicopatologia fundamental, vol. IX, núm 1, março, 2006.


4 - PORTAL IPEA. www.ipea.gov.br




3 comentários:

  1. VERDADE QUASE TODO MUNDO É HUMILHADO ,MORRE A MINGUA.

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  2. Muito esclarecedor, amiga! Eu particularmente não sabia do "SUS indireto". Em um país de tantas mazelas, o lado bom da coisa deveria ser divulgado!

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    1. Pois é, cara leitora e amiga! Se vamos à farmácia comprar remédios ou à padaria, estamos sim utilizando o SUS. Um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo, talvez o mais universal e equânime sistema, mais de 20 anos após sua criação, possui uma abrangência muito maior do que a percebida pela maioria dos brasileiros. Obrigada pelo comentário. Visite-nos sempre!

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